3 observações sobre a psicanálise
Freud, primeiras impressões
Freud, a arte (principalmente, o cinema) e os estudos culturais
Neurose obsessiva no filme Gainbourg - O homem que amava as mulheres (Joann Sfar, 2011)
Freud explica. Explica com clareza, com estilo, com riqueza de detalhes e exemplos. Parece não economizar palavras e saber escolhe-las como ninguém. Freud explica historicamente, contextualiza, depois repensa, corrige, ressalva, e anota em suas memoráveis notas de roda pé, cuja importância da leitura é frequentemente destacada pelos orientadores do estudo da psicanálise. Freud explica através da arte e, principalmente, do mito. Mas acima de tudo, Freud explica com classe, e sua obra, ironicamente, nos hipnotiza. É fácil apaixonar-se por suas passagens marcantes, tanto devido ao poder de síntese, de máximas, como pela capacidade de desenvolver ideias não apenas abstratas como, também, complexas. Assim, seu estilo de escrita indutiva nos revela aos poucos, em suas palavras, "a construção de nosso arcabouço psicológico" (FREUD, [1900] 2001, p. 506). Veremos a seguir alguns exemplos que ilustram estas impressões.
Para iniciarmos, lembremos, então, de uma curiosa nota de rodapé, em O mal-estar na Civilização, sobre a procedência dos primeiros atos culturais da humanidade, valorizando, dentre eles, o domínio do fogo. Nesta nota Freud ensaia uma interpretação - "não inteiramente segura", o próprio adverte - do domínio do fogo como uma renúncia instintual, um prazer infantil, que seria apagar o fogo com um jato de urina. Freud, assim, assemelha a chama do fogo ao falo, considerando a fruição do ato de apagar o fogo uma disputa homossexual:
Quem primeiro renunciou o fogo a este prazer, poupando o fogo, pode leva-lo consigo e coloca-lo ao seu serviço. Ao amortecer o fogo de sua própria excitação sexual, havia domado a força natural do fogo. Essa grande conquista natural seria então o prêmio por uma renúncia instintual. (FREUD, [1930a]