O que Kant entende por liberdade
Kant diferencia o uso privado do uso público da razão. Não se deve entender o primeiro, de forma alguma, como algo aparentado com a "privacidade", no sentido corriqueiro, próprio do senso comum.
“Denomino uso privado aquele que o sábio pode fazer de sua razão em um certo cargo público ou função a ele confiado. Ora, para muitas profissões que se exercem no interesse da comunidade, é necessário um certo mecanismo, em virtude do qual alguns membros da comunidade devem comportar-se de modo exclusivamente passivo para serem conduzidos pelo governo, mediante uma unanimidade artificial, para finalidades públicas, ou pelo menos devem ser contidos para não destruir essa finalidade. Em casos tais, não é sem dúvida permitido raciocinar, mas deve-se obedecer.”
Quando Kant escreveu sobre “Que é Esclarecimento?”, estava exercendo seu saber dentro dos limites do condicionamento do uso privado da razão. Ora, esta idéia de que em um setor de nossas vidas o pensamento está limitado às convenções e normas do estado, nos remeterá em um eterno uso privado da razão. O que Kant entende como uso público da razão ainda está dentro das convenções estatais: por mais que não seja mais um serviço prestado formalmente – burocraticamente - ao estado, este ainda se encontra em suas outras formas no cotidiano, inclusive, na fiscalização de qualquer material intelectual que esteja circulando nos limites públicos. O público para Kant é ainda precisamente o território do estado que, obviamente, não aceitaria nada além que lhe tivesse utilidade egoísta assim como a mão-de-obra de um professor. Em uma peculiar exceção, o máximo que se aceitaria seria o que lhe parecesse inofensivo, meramente poético, exagerado ou absurdo. Esperar que durante todo o pensamento de um homem suas inferências estarão coincidentemente em acordo, ou melhor, guiado autonomamente e paralelamente aos interesses de um superior, é esperar uma