O MARTELO DAS BRUXAS
Copyright © 1978-1995. Sylvio Ourique Fragoso
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Parte I
Talvez fosse o caso de iniciarmos estas linhas com um pedido de desculpas ao leitor. É que aquilo que aqui se vai ler não é bonito. As narrativas que faremos abordarão fatos que causam repugnância e espanto, quando menos. Não nos move o desejo de acusar instituições ou pessoas. Não queremos ferir suscetibilidades, melindrar consciências ou atingir brios e por isso penitenciamo-nos apenas por termos vindo recordar o capítulo mais negro da história da humanidade, capítulo que se escreveu, paradoxalmente, a pretexto de manter acesa a fé nos ensinamentos do meigo Jesus. Não teria sentido estarmos aqui para qualquer acusação, até porque os fatos, analisados à luz da reencarnação, podem nos colocar na posição de co-participante, e diga-se que se nos fosse dada a graça de um desejo, melhor nos sentiríamos imaginando-nos como vítima que como executor. Mas como estas coisas todas já aconteceram, não se pode mudar a realidade e nem adianta fazer de conta que nada ocorreu e nem tampouco tentar fazer crer que os fatos não foram exatamente como aconteceram na verdade. Busquemos, pois, tanto quanto possível, o distanciamento emocional necessário para que a rememoração de tantas dores não nos enseje a reativação de velhas mágoas e tentemos alcançar apenas a posição de historiador, ainda que bisonho.
Digamos desde logo que "Martelo das Bruxas" é a tradução de Malleus Maleficarum, nome de uma obra que se tornou o código, a cartilha oficial dos inquisidores ao tempo da Santa Inquisição. Malleus, segundo Ovídio, era um instrumento, espécie de marreta, usado para abater criminosos.
Mas antes de ferirmos o assunto principal, pedimos vênia para um pequeno retrospecto que nos há de levar de volta à Roma dos Césares.
Até o ano 313 o Cristianismo esteve revestido de sua singeleza original. Os primitivos cristãos eram pobres em espírito e desprovidos de interesse por bens materiais. Não