O DESENVOLVIMENTO COMO EXPANSÃO DE CAPACIDADES
Amartya Sen
Professor de Economia e Filosofia da Universidade de Harvard
Em sua Fundamentação da Metafísica dos Costumes1 Immanuel Kant sustentou a necessidade de considerar os seres humanos como fins em si mesmos, e não como meios para outros fins: "age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na sua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre e simultaneamente como fim e nunca simplesmente como meio". Esse princípio é importante em muitos contextos — mesmo na análise da pobreza, do progresso e do planejamento. Os seres humanos são os agentes, beneficiários e juizes do progresso, mas também são, direta ou indiretamente, os meios primários de toda produção. Esse duplo papel dos seres humanos dá origem à confusão entre fins e meios no planejamento e na elaboração de políticas. De fato, essa confusão pode tomar — e freqüentemente toma — a forma de uma noção da produção e da prosperidade como a essência do progresso, considerando-se as pessoas como os meios pelos quais tal progresso na produção é obtido (ao invés de considerar a vida das pessoas como a finalidade última e tratar a produção e a prosperidade como meios, tão somente, para atingi-la).
Com efeito, a ampla prevalência do aumento da renda real e do crescimento econômico como critérios do desenvolvimento exitoso pode ser, precisamente, um aspecto do erro contra o qual Kant nos chamou a atenção. Esse problema é particularmente importante na avaliação e no planejamento do desenvolvimento econômico. O problema não está, é claro, no fato de a busca da prosperidade econômica ser tipicamente considerada um objetivo central do planejamento e do processo de formulação de políticas. Isso não é, por si só, irrazoável. O problema refere-se ao nível no qual esse objetivo deve ser fixado. Trata-se de um objetivo intermediário, cuja importância subordina-se ao que favorece em última instância a vida humana? Ou se trata do objetivo último daquele