O Cemiterio Dos Vivos
Fonte:
LIMA BARRETO, Afonso Henrique de. Diário do hospício; o cemitério dos vivos. Rio de
Janeiro : Secretaria Municipal de Cultura, Departamento Geral de Documentação e Informação
Cultural, Divisão de Editoração, 1993, p. 95-179.
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O CEMITÉRIO DOS VIVOS
Lima Barreto
Quando minha mulher morreu, as últimas palavras que dela ouvi, foram estas, ditas em voz cava e sumida:
- Vicente, você deve desenvolver aquela história da rapariga, num livro.
Ainda durou cerca de dois dias, mas quase sem fala. Balbuciava unicamente; em geral, não entendia o que queria por aí, mas pelos gestos e sinais que fazia.
Nas ocasiões em que me aproximava dela, nos seus últimos momentos, o seu olhar de moribunda tinha uma doce e transcendente expressão de piedade. Era como se ela dissesse: “Vou morrer!Que pena! Vou deixa-lo só por este mundo afora”.
Para o filho, que andava próximo dos quatro anos, não lobriguei nos seus olhos uma tão profunda manifestação de comiseração. Não sei, não me recordo, se, logo após a sua morte, pusme a pensar nas suas palavras, a bem dizer as últimas, e no meu casamento e outros fatos domésticos. Mas o certo é que elas me ficaram gravadas; e nunca mais se foi de mim a imagem daquela pobre moça a morrer, com pouco mais de vinte e cinco anos, e o sentimento da dor que se lhe estampava no