A vida sexual dos casados na sociedade antiga
Da doutrina da Igreja à realidade dos comportamentos
Jean-Louis Flandrin (*)
Poucas fontes falaram da sexualidade conjugal com tanta minúcia quanto os tratados de teologia moral, as coletâneas de casos de consciência, os manuais de confissão, etc. Tomarei então como ponto de partida esses documentos eclesiásticos, insistindo especialmente nas prescrições neles contidas que mais nos parecem estranhas hoje em dia. Depois procurarei saber em que medida esta literatura nos esclarece sobre a vida dos casais de outrora.
Há, no centro da moral cristã, uma desconfiança muito aguda em relação aos prazeres carnais, porque eles mantêm o espírito prisioneiro do corpo, impedindo-o de se elevar na direção de Deus. É necessário comer para viver, mas deve-se evitar se entregar aos prazeres da gula. Da mesma maneira, somos obrigados a nos unir a outro sexo para gerar filhos, mas não devemos nos prender aos prazeres sexuais. A sexualidade nos foi dada somente para nos reproduzirmos, Utilizá-la para outros fins, como por exemplo para o prazer, é malbaratá-la.
Em nossa sociedade, como nas outras, observam os moralistas cristãos, a instituição familiar é a que melhor se adapta à educação das crianças, e aliás só se podem conceber filhos legítimos – isto é, aptos a nos sucederem – dentro do casamento legítimo.
Toda atividade sexual fora do casamento tem, portanto, necessariamente uma outra finalidade que não a procriação e constitui um pecado. É por isso que nenhuma é permitida. Conhecemos melhor essa proibição do que suas razões teológicas, para não falar das razões históricas, que mereceriam um estudo mais aprofundado.
Por outro lado – e isso já é mais estranho para nós – a união sexual só era legítima, dentro do próprio casamento, se fosse realizada para uma boa finalidade, isto é, para gerar filhos, ou para dar ao cônjuge o que lhe havíamos prometido no contrato de casamento. A essas duas boas razões para se unir ao marido ou