A hora da estrela
26976 palavras
108 páginas
A HORA DA ESTRELA Clarice Lispector *** CDD - 869.93 CDU 869.0(81)-3 A Hora da Estrela Editora: Francisco Alves Correção: Doralice -- Página 5 APRESENTAÇÃO Escrever estrelas (ora, direis) Clarice Lispector deixou vários depoimentos sobre a sua produção literária. Em alguns, parecia se defender do estranhamento que causava em leitores e críticos. Ela tinha consciência de sua diferença. Desde pequena, ao ver recusadas as histórias que mandava para um jornal de Recife, pressentia que era porque nenhuma "contava os fatos necessários a uma história", nenhuma relatava um acontecimento. Sabia também, já adulta, que poderia tornar mais "atraente" o seu texto se usasse, "por exemplo, algumas das coisas que emolduram uma vida ou uma coisa ou romance ou um personagem". Entretanto, mesmo arriscando-se ao rótulo de escritora difícil, mesmo admitindo ter um público mais reduzido, ela não conseguiria abrir mão de seu traçado: "Tem gente que cose para fora, eu coso para dentro". Ela se afastou dos "escritores que por opção e engajamento defendem valores morais, políticos e sociais, outros cuja literatura é dirigida ou planificada a fim de exaltar valores, geralmente impostos por poderes políticos, religiosos etc., muitas vezes alheios ao escritor", em nome de uma outra forma de questionar a realidade e nela intervir, através da literatura. Talvez sem o saber, Clarice estava optando por um tipo de escrita característica do escritor moderno, para quem, no dizer do crítico francês Roland Barthes, escrever é "fazer-se o centro do processo de palavra, é efetuar a escritura afetando- se a si próprio, é
fazer coincidir a ação e a afeição (...)". Por esta via, formula-se uma outra qualidade de experiência -- Página 6 envolvida na escrita, uma nova perspectiva pela qual a linguagem é concebida: mais importante do que relatar um fato, será praticar o autoconhecimento e o alargamento do conhecimento do mundo através do exercício da linguagem. A hora da estrela leva esta proposta às