A história do Divã
"Meu eu interior derreteu-se, logo que me coloquei no sofá velho, esfarrapado. Como o meu corpo afundou no macio de algodão, a minha alma desmoronou com ela, as lágrimas encheram meus olhos. Não teria sido o mesmo se eu estivesse sentado em uma cadeira. Qualquer coisa que suporta minhas costas reforça minha resistência."
Essa ode ao divã – peça irremovível do cenário psicanalítico que nele persiste mesmo quando nele não está presente – foi entoada por um paciente, conforme descrito por Sebnem Senyener, jornalista e novelista turca, em seu artigo “How the divan became the couch?“. Revela também o papel desse móvel – menos um mobiliário inerte, mais um interlocutor da dinâmica psicanalítica – que se tornou tão símbolo da psicanálise como o próprio Freud. Pode-se dizer mesmo que a psicanálise não se reconhece como tal sem o divã, em que pese a peça não ser exclusiva dos consultórios, nem ter “nascido” com o advento da psicanálise. Mas há que se reconhecer que sem a técnica criada, nominada, desenvolvida e difundida por Freud, essa peça de mobília – hoje com ares de vanguarda, art noveau, que serve como espreguiçadeira para o corpo e expansiva para a mente – não passaria de um sofá sem encosto, esquecido no canto da sala.
A Berggasse 19, em Viena, Áustria, abrigou o consultório de Freud entre 1891 e 1938, quando o psicanalista fugiu para Londres, escapando das garras do nazismo que haviam se apoderado da Áustria. O divã foi com ele. Peter Gay assim relata o fato em “Freud, Uma vida para o nosso tempo” (Cia. das Letras, 2005): “Os bens que tivera de resgatar das mãos dos nazistas – seus livros, antiguidades, o famoso divã – finalmente haviam chegado [a Londres], e foram arrumados de modo que os dois quartos do térreo se pareciam muito com seu consultório e o escritório anexo na Berggasse 19”. Quando Anna Freud, filha do psicanalista,