A entrevista como método
Fernando Frochtengarten
Resumo: O nome de Eduardo Coutinho ocupa páginas centrais na história do cinema documentário brasileiro. Conhecido pelas entrevistas com pessoas anônimas, seus filmes revolucionaram a produção no gênero: ajudaram a derrubar o mito da neutralidade dos documentários e desfizeram a separação entre o diretor e os personagens. As transformações que sua obra imprimiu no campo estético e epistemológico próprios ao cinema têm afinidades com as mudanças de paradigmas experimentadas pelas ciências humanas no século passado. Este artigo apresenta uma entrevista com Eduardo Coutinho. Nela, o cineasta discute a concepção do real presente em seus filmes e o poder de transformação do cinema sobre os homens e a sociedade; principalmente, fala sobre as entrevistas, método em evidência nas ciências humanas e no cinema.
Palavras-chave: Entrevista. Cinema. Etnografia. Psicologia social.
Preâmbulo
O panorama histórico e o atual quadro de produções do cinema documentário brasileiro são indissociáveis do nome de Eduardo Coutinho. Diretor de filmes como
Cabra marcado para morrer, Santo Forte, Edifício Master e Peões (ver filmografia completa ao final desse artigo), sua marca essencial são as entrevistas que realiza com pessoas anônimas. Seus documentários são compostos por uma sucessão de entrevistas após as quais caem os letreiros. Nada mais.
Podemos entrever alguma comunidade entre os entrevistados de cada um dos filmes de Eduardo Coutinho. Ainda que frequentemente não se conheçam, os personagens são amarrados pela coabitação de uma geografia, pelo exercício de um mesPsicologia UsP, São Paulo, janeiro/março, 2009, 20(1), 125-138
125
mo trabalho ou pela coparticipação em acontecimentos pregressos. Porém, é tênue essa comunhão. Ela circunscreve um campo de experiências humanas sem que as singularidades de cada ser humano sejam apagadas por teses generalizantes sobre as