Um narcísico mundo novo
Numa cultura narcisista realizada, a ação política só será possível se seus sujeitos aceitam seu funcionamento
Um sujeito, em princípio, se constitui por dois caminhos. De um lado, se identifica aos valores, obrigações, tradições que cada um recebe de sua cultura étnica, nacional, familiar etc, (estas são as identificações simbólicas). Do outro, se esforça para coincidir com a imagem que poderia satisfazer aos outros (primeiro aos pais). Este esforço é –resumidamente, para a psicanálise– o narcisismo, mais incômodo do que simplesmente se apaixonar por seu próprio rosto.
Pois, como escolher a imagem que poderia agradar? Os outros são muitos e talvez nem saibam direito o que gostariam que fôssemos. Mesmo quando as imagens propostas parecem estabelecidas, fica a dúvida –radical em nossa cultura– que os outros queiram de nós justamente que sejamos diferentes de tudo o que esperam: únicos.
A complicação não para aí: a unicidade que pareceríamos dever alcançar precisa se tornar uma vinheta, uma moda, para que se confirme nossa identidade com ela. Assim, por exemplo, pinto os cabelos de verde para ser único, mas preciso da moda punk para estar certo que minha unicidade (que já não existe mais) segue o figurino.
Dos dois caminhos constitutivos da subjetividade qual prevalece hoje?
Para a modernidade desde o fim do século 18, o indivíduo em sua autonomia vale mais do que a comunidade que o abriga. É provável então que ele recuse o patrimônio herdado e que, para ser alguém, lhe sobre correr atrás de imagens. Todo o mundo, aliás, concordará que, em nossa época, diluem-se os valores e as referências tradicionais e, talvez momentaneamente, prevaleçe a caça às imagens agradáveis (aos outros).
Mas só poucos radicais se aventurarão a concluir que o sujeito contemporâneo não entra no mundo por identificação simbólica. Eles dirão que o homem de hoje é narcísico, se constitui só seguindo a sedução das imagens que o mundo lhe propõe e com