Ulpiano Bezerra De Meneses A Cultura Material No Estudo Das Sociedades Antigas
Ulpiano T. Bezerra de Meneses
Departamento de História — FFLCH/USP
Embora o título desta exposição (*) privilegie o campo da História
Antiga, o problema a que se refere permeia todos os domínios da História . Certamente, no caso da Antiguidade, ele é crucial, pela raridade e fragmentação das fontes escritas . Meu propósito aqui, porém, não é montar uma apologia da cultura material, mas lançar algumas pistas para refletir sobre o alcance de um tipo de documento, as coisas físicas, como campo de fenômenos históricos, sem o qual a compreensão de uma sociedade se vê comprometida. Esta reflexão é tanto mais necessária quanto se verifica, ainda, o descaso habitual dos historiadores a respeito .
Os padrões usuais.
Na bibliografia recente de História da Grécia e de Roma, por exemplo (domínio que tomarei como referência principal), três posturas são marcantes. (*) — Este artigo é a versão, refundida e acompanhada de notas de rodapé, do texto de conferência pronunciada no I Simpósio Nacional de História Antiga, realizado em agosto de 1983 na Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, e que deverá aparecer nas Atas respectivas.
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A primeira é a simples marginalização da cultura material, a supressão, no horizonte histórico, do universo físico. Autores de máxima importância, como Jean-Pierre Vernant, por vezes tanto ignoram a realidade física, que descarnam os gregos antigos, quase os transformando em zumbis, que se alimentam de puras estruturas mentais, as quais, por sua vez, dão ser à realidade social, sempre algo estática . Assim, no seu estudo do mito (aliás percuciente e, sob muitos aspectos, inovador e de muita densidade), ele utiliza apenas matéria prima literariamente processada (1); nunca levou em consideração, por exemplo, a possibilidade de matrizes visuais para as narrações míticas . Mesmo num estudo sobre, precisamente, o "nascimento das imagens" (2), o autor reduz a vastíssima problemática das