Traducao
Desconstruir para que?
DESCONSTRUIR PARA QUÊ?
Paulo Henriques Britto
PUC-RJ
A idéia central que vou desenvolver aqui não é de modo algum uma novidade. Minha crítica à desconstrução baseia-se num argumento que já foi levantado várias vezes por diversos autores.1
Meu objetivo é desenvolver o argumento de modo um pouco mais aprofundado. Quando, em ciência, se critica um conceito em vigor e se propõe um outro em seu lugar, normalmente o que se faz é demonstrar que o conceito original não serve adequadamente a seu propósito e que o novo conceito proposto é mais adequado. Assim, nos contextos relevantes para a ciência, propõe-se que o novo conceito seja empregado no lugar do antigo, o qual pode continuar a ser usado em contextos de baixa relevância teórica, na vida cotidiana. Criticar um conceito não significa necessariamente relegá-lo à lata de lixo da história, e sim apenas relativizá-lo, limitar sua utilização aos contextos que não são cientificamente relevantes.
Um exemplo deixará claro o que quero dizer. Suponhamos que um historiador se declara adepto do materialismo histórico. Isso implica, entre outras coisas, que ele não aceita os pressupostos teóricos de uma historiografia para a qual a história é essencialmente determinada pelos atos de grandes homens, líderes carismáticos que conseguem alterar o curso dos acontecimentos através da imposição de sua vontade. Para o materialista histórico, são os modos de produção da vida material, os fatores econômicos, que constituem o motor da história, e não os atos dos grandes
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indivíduos. Assim, ainda que numa conversa privada, sem maiores implicações, nosso historiador marxista atribua à vontade férrea de Lênin a vitória da Revolução Russa, no momento em que ele estiver escrevendo um texto de história sobre os eventos de 1917 é de se esperar que ele tenha a cautela de deixar claro que as verdadeiras causas da Revolução se encontram em fatores