Strauss
Leo Strauss
Perto do fim da Primeira Guerra Mundial veio a lume um livro com o ominoso título de O Declínio, ou Ocaso, do Ocidente1. Spengler entendia por Ocidente não aquilo que temos o hábito de chamar de civilização ocidental, a civilização que tem início na Grécia, mas uma cultura que surgiu por volta do ano Mil na Europa setentrional; a sua noção inclui, sobretudo, a moderna cultura ocidental. De modo que o que ele predisse foi o declínio, ou ocaso, da modernidade. O seu livro é um poderoso documento sobre a crise da modernidade. Que essa crise está aí é algo óbvio mesmo para as menores inteligências. Para entender a crise devemos, primeiro, entender o caráter da modernidade.
A crise da modernidade se revela no fato, ou consiste no fato, de que o moderno homem ocidental não sabe mais o que quer – de que ele não mais acredita poder saber o que é bom ou mau, o que é certo ou errado. Até há poucas gerações atrás, era geralmente tido como evidente que o homem podia saber o que é certo e errado, o que é a ordem social justa ou boa ou melhor – numa palavra, que a filosofia política é possível e necessária. Em nosso tempo essa fé perdeu o seu poder. De acordo com a visão predominante, a filosofia política é impossível: ela foi um sonho, quiçá um sonho nobre, mas de todo modo um sonho. Embora se verifique um amplo acordo nesse ponto, as opiniões diferem sobre a razão pela qual a filosofia política estaria baseada num erro fundamental. Segundo a visão mais difundida, todo conhecimento digno desse nome é conhecimento científico; mas o conhecimento científico não pode validar juízos de valor; ele está limitado a juízos factuais; e, não obstante, a filosofia política pressupõe que juízos de valor podem ser validados racionalmente. Segundo uma visão menos difundida, mas mais sofisticada, a separação predominante entre fatos e valores não se sustenta: as categorias de entendimento teórico de alguma forma implicam princípios de avaliação;