Richard Dawkins
Hoje reina entre os ateístas, por sua defesa vigorosa do pensamento científico e pela crítica humanista aos enganos da religião. O pensador inglês tem a seu favor o lastro de milênios de pensamento crítico e o vigor de argumentos necessários para a civilização. A meta é a emancipação do humano diante do que ele mesmo criou, uma rede de representações do mundo sobrenatural, onde habitariam deuses e de onde comandariam a vida na Terra e no além. Emancipado, o indivíduo moderno pode chamar de ficção cultural o que bilhões de pessoas chamam de Senhor, e pode fundar sociedades sobre valores de liberdade, de tolerância e de consistência moral e jurídica.
Minoritários, os ateus parecem exóticos, e a crença em divindades, natural. Isto obriga os ateus a manter um arsenal de argumentos, certa vigília e, eventualmente, atitude de combate, o que aborrece crentes e produz nova safra de desentendimentos. Sem a galhardia dos céticos, agnósticos e ateus, porém, pouco saberíamos do universo, do corpo humano e das soluções jurídicas e tecnológicas que enchem de conforto a vida moderna. A discussão entre razão e fé não pode ser arquivada; será atual por muitos séculos.
Instituída há 5 mil anos, junto com o Estado e antes de alfabeto, biblioteca, museu, universidade, telescópio e internet (!), a religião é o antigo antiquado intrometido na modernidade. Todavia, alguns antigos já percebiam o problema, e o disseram com inteligência que parece moderna, falando nosso idioma. Ei-los.
Escrito na tumba do faraó Intef II, no Egito de 4.084 anos atrás, o “canto de um harpista” revela inteligência cética onde imperava poderosa teologia. “Ninguém volta (...) para dizer o que precisam (...)”, diz a canção: tudo o que se fala do além (base da cultura egípcia) é invenção dos que aqui estão, em estado de ignorância. “Por isso alegra teu coração, esquece que serás um espírito, segue teu desejo por mais que vivas, põe mirra em tua cabeça, veste linho fino”, canta o(a) harpista,