Retorica e Cultura Grega de A
António Fidalgo
Retórica e democracia
Não pode haver uma definição de retórica sem a referir à cultura grega, não só porque retórica é etimologicamente um termo grego, mas sobretudo porque a retórica constitui um dos traços fundamentais e distintivos do génio grego. O termo grego retoriké é afim aos termos retor (orador) e retoreia (discurso público, eloquência) e significa tanto a arte oratória como a disciplina que versa essa arte. Contudo, o sentido genuíno do termo “retórica” só se alcança quando se percebe como a civilização grega se distinguiu de todas as outras por assentar na palavra pública.
Os gregos tinham consciência desse traço distintivo e enalteciam-no. Isócrates elogia Atenas por ser a cidade que descobriu a civilização assente nas palavras, e de saber retirar da capacidade da linguagem as consequências decorrentes dessa superioridade humana sobre todos os animais: “Foi a nossa cidade que revelou a cultura, que descobriu e organizou todas estas vantagens, que nos ensinou a agir e dulcificou as nossas relações, e que distinguiu entre as desgraças provocadas pela ignorância e pela necessidade, e ensinou a precavermo-nos contra aquelas e a suportar estas corajosamente. Foi ela que honrou a eloquência, que todos desejam, e cujos possuidores são invejados. Ela tem consciência de que somos, de todos os animais, os únicos que a natureza dotou deste privilégio e que, por termos esta superioridade, diferimos em tudo o mais; via que nas demais actividades a sorte é tão atrabiliária que é frequente que os inteligentes sejam mal sucedidos e os tolos prosperem, mas que os discursos belos e artísticos não são apanágio das pessoas inferiores, mas obra de uma alma que pensa bem; que os sábios e os que parecem ignorantes diferem uns dos outros sobretudo nisto, e ainda que os que foram criados desde início como homens livres não se conhecem pela coragem, riqueza ou qualidades dessa espécie, mas se distinguem sobretudo pela maneira de