respeito ao cadaver
Professor Renato Locchi
A utilização do cadáver é uma tríplice lição educativa :
a. Instrutiva ou informativa, como meio de conhecimento da organização do corpo humano, precedendo ao estudo no vivo;
b. Normativa, disciplinadora do estudo , pelo seu caráter metodológico e de precisão de linguagem;
c. Estético-moral, pela natureza do material de estudo, o cadáver, e pelo método de aprendizado, a dissecação, que é experiência e fuga repousante na contemp lação da beleza e harmonia de construção do organismo humano.
Essencialmente, porém, lição de ética e de humildade, pois :
1. É o cadáver do indigente – homem, mulher, criança, velho – marginal da vida, da família e da sociedade; cadáver que – como o doente indigente – não é fato isolado da comunidade, mas seu reflexo, dela provindo; cadáver que é meio para o vivo como o doente o é para a sociedade;
2. Cadáver cujos despojos miseráveis no "abandono da morte parecem ainda sofrer e pedi r piedade"; partes mortas que serão vivificadas pelo calor da juventude estudiosa e de seu sentimento de gratidão;
3. Cadáver de pessoa sem lar, abandonada, esquecida ou ignorada pela família e pela sociedade em parte, ao menos, culpada; de pessoa que m al viveu, do nascimento à agonia solitária, sem amparo e sem conforto amigo; vida que de humana só recebe o apelido;
4. Cadáver de um "irmão em humanidade", que não teve ilusões, descrente e sofrido; de pessoa que, quanto mais atingida pela desventura, mais se aproximava da mesa de dissecação, como prê mio à sua desgraça; 5. Cadáver de alguém que, se foi inútil, oneroso ou mesmo nocivo à sociedade, paga, pelo conhecimento que proporciona ao futuro médico, com alto juro, o mal que se lhe atribui, do qual é mais vítima que culpado;
6. Cadáver que é de alguém anônimo e não de um de nós – eu ou um dos senhores – apenas pelo capricho do jogo do acaso do destino genético;
7. Cadáver do anônimo que adquire o valor de um