Resenha - terra sonâmbula

Mia Couto: Sobre suas brincriações

A literatura africana vem invadindo as prateleiras das livrarias brasileiras de um modo inovador e nada convencional. Não só as semelhanças lingüísticas, mas também temas atraentes fazem com que nossos leitores se encantem com obras como “Terra Sonâmbula”, de um dos autores mais consagrados desse tipo de literatura, Mia Couto.
Passado no país africano Moçambique, em um quadro de pós-independência, esse romance narra a caminhada de duas personagens, Muidinga e Tuahir, que encontram durante a mesma um automóvel que lhes servirá de abrigo, e, dentro desse, um diário,repleto de episódios sobre a história de Kindzu, que estimularão o imaginário de Muidinga em sua caminhada com Tuahir.
O trabalho de Mia Couto nessa obra não se restringe apenas a um enredo vivaz, mas ele também esculpe frases e palavras que mantêm viva a magia da estória. E é sobre esse lado morfológico da obra que vamos discorrer.
Mia Couto usa de recursos lingüísticos, como neologismos, aglutinações e justaposições, para uma escrita original e inovadora. Suas narrativas são repletas de palavras, supostamente, inexistentes na língua portuguesa, mas que não perdem o sentido por derivarem de outras palavras, que são facilmente reconhecidas, como em “dormecer”, junção de dormir com adormecer; ou “vagueandando”, união das palavras vaguear e andar. Ou ainda transforma substantivos em verbos inexistentes, como em “enluarando” ou “pratinhar”, ou substantivos e verbos em adjetivos novos: “dorminhoso”, “barulhoso”, etc.
Se perguntado sobre o uso desses recursos, Mia Couto justifica: “É uma coisa que me acontece, meus pais sempre se lembram disso, desde menino – certa desobediência em relação àquilo que era norma. Começa pelo meu próprio nome. Nasci António e, quando tinha dois anos e meio, decidi que queria me chamar Mia, pela relação de afeto que tinha com os gatos. Eu pensava que era um deles. Mais tarde, a poesia foi uma escola de desobediência, de transgressão. E