religiao
Disciplina: História da Arquitetura e da Cidade I
Professora Mônica Eustáquio Fonseca
NÓS E A ARTE
[COLI, Jorge. In: O que é arte? São Paulo: Brasiliense, 1988, p. 87-92]
Mário de Andrade disse uma vez que a arte não é um elemento vital, mas um elemento da vida. Não nos é imediatamente necessária como a comida, as roupas, o transporte e descobrimos nela a constante do supérfluo, do inútil. Uma lâmina num cabo é uma faca, mas é preciso que o cabo seja esculpido, que a lâmina seja gravada, para que a faca, objeto de um trabalho supérfluo, exprima o amor e a atenção que o homem consagrou a ela.
Se a arte é associada a um objeto útil, ela é, nele, o supérfluo.
Benvenuto Cellini, em 1540, realiza, para o rei Francisco I da França, um saleiro. Mas
“saleiro que em nada se assemelha aos saleiros comuns”, como diz o próprio artista em suas memórias, pois se trata de uma extraordinária escultura dos deuses do mar e da terra, Netuno e Ops, sobre um pedestal ricamente ornado. Os recipientes do sal e da pimenta têm a forma de uma barca e de um arco de triunfo. A desproporção entre a função banal e o trabalho artístico é evidente e assinala fortemente o quanto a arte significa supérfluo.
Não se trata apenas de embelezamento, de ornamento. Trata-se de algo próprio à idéia que possuímos da arte. Em nossa cultura, ela se encontra no domínio da pura gratuidade.
Há algum tempo, houve uma corrente de gosto que buscava nas formas exigidas pelas funções dos objetos a manifestação da arte: ela foi chamada, por vezes imprópria ou obscuramente, de funcionalismo. Este, embora se quisesse fundamentado numa reflexão racional sobre as funções, era, em verdade, uma poética do funcional. Não somente as funções manifestavamse além delas mesmas (o aerodinâmico desenho das carrocerias de automóveis era mais uma imagem dessa função que uma verdadeira exigência), como se buscava, nas marcas das