Relações de poder na organização
– arte e comunicação como estratégia de participação e transformação social no contexto da reforma psiquiátrica
Renata Ruiz Calicchio
Em 2007, ano em que se celebram vinte anos da luta antimanicomial no
Brasil, poder-se-ia indagar após tanto debate e mobilização sociopolítica: O que se pode ou deve ser entendido por reforma psiquiátrica? O que mudou em relação à política e às práticas de atenção à saúde mental no país? O que há de novo? Que alternativas e estratégias estão sendo construídas a fim de enfrentar o estigma e promover a participação e inclusão social dos sujeitos em sofrimento mental na sociedade? Como a arte e a comunicação se articulam a esse processo?
“Estou vivendo no mundo do hospital / tomando remédios de psiquiatria mental / Haldol, Diazepam, Rohypinol, Prometazina1[1] / Meu médico não sabe como me tornar um cara normal / Me amarram, me aplicam, me sufocam num quarto trancado/ Socorro! Sou um cara normal asfixiado / Ai, ai, ai, que sufoco da vida! Sufoco louco! / Tô cansado de tanta levomopromazina.”
Os versos citados, apesar de representarem um flash do cotidiano empobrecido da relação médico-paciente dentro dos hospitais psiquiátricos, são, na realidade, o reflexo de um processo histórico complexo que vem permitindo que este mesmo tratamento e relação sejam totalmente transformados. Seus autores são usuários2 e técnicos do Centro Psiquiátrico do Rio de Janeiro (CPRJ), serviço estadual de atenção à saúde mental localizado na zona portuária do município e integrantes do grupo musical Harmonia Enlouquece, que junto a tantos outros projetos socioculturais emergentes no campo da saúde mental vem evidenciando transformações nas relações e no tratamento à loucura. No entanto, é importante enfatizar que esses sujeitos falam com tanta propriedade sobre esta realidade porque um dia experimentaram na pele serem taxados de “loucos”, diga-se – perigosos, incapazes, insensatos e