Qual psicanálise para as crises financeiras
Paulo Sternick
Obra de Jane Wynn
Psicanalista
76 SIGMUND SMITH
INTELIGÊNCIA
psi- ?
QUAL
canálise para as crises financeiras
E
ncontrei o psicanalista W.R. Bion no Copacabana Palace, nos idos de 1974, quando de sua visita ao Rio de Janeiro para seminários e supervisões, e ouvi dele algo que se aplica aos turbulentos dias de hoje: “a inteligência pode levar a Humanidade à destruição1.” Nada podia soar mais paradoxal aos ouvidos de um jovem aspirante a psicanalista.
Estávamos ainda em plena guerra fria e tínhamos 43 mil ogivas nucleares a mais do que as 20 mil que ainda restam hoje espalhadas por alguns países. Na atualidade, é verdade, ainda se luta pela não proliferação, e, apesar das improváveis, mas não impossíveis ameaças terroristas usando bombas sujas, o risco diminuiu o suficiente para atentarmos para outros artefatos. Ao som de Caetano Veloso, em É proibido proibir, ou de John Lennon, em The dream is over, naquela época um novo mundo já emitia seus balbucios rumo a algo que também se revelaria explosivo: a maior globalização, as sucessivas crises econômicas, a acentuação da economia neoliberal – especialmente a inteligência financeira que iria disparar.
ABRIL• MAIo • JUNHo 2010
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I N S I G H T
A inteligência destrutiva expressa o dilema do único ser do planeta capaz de formidável raciocínio sem garantia de exercer sabedoria a fim de não usá-lo para produzir catástrofe. Teria razão o psicanalista Jacques Lacan, para quem “o discurso capitalista é loucamente astucioso, funciona perfeitamente, não pode funcionar melhor. Mas justamente por funcionar depressa demais, se consome. Consome-se tão bem que se esgota?” 2 A chanceler alemã
Angela Merkel, no clímax da crise europeia agravada pelo ataque especulativo a partir do risco de default grego, acusou a sanha destrutiva de parte do mercado financeiro, a
“matilha dos lobos”, que a obrigou a suspender no mercado as “vendas descobertas” (naked short-selling) de títulos e ações sequer