Porque porquê?
A simples apresentação da palavra PORQUE evidencia a existência de uma locução (POR + QUE), sem que se possa garantir, na generalidade dos casos, quando se deixou de grafar separado (POR QUE) para grafar junto (PORQUE). Certo é que muitos escritores sempre ignoraram tal distinção (junto x separado), de forma que, até no mesmo texto, se encontram exemplos de POR QUE e PORQUE, em idênticas estruturas gramaticais, o que denuncia, por parte desses autores, desprezo pela questão bizantina, sem, nem de longe, ser comprometida a excelência literária de seus textos.
Mais modernamente, contudo, os gramáticos têm se empenhado (sic) em estabelecer um código de aplicação, ao qual se deve, sem dúvida, o mérito de uma uniformização vantajosa para a descrição gramatical.
Parece que o PORQUÊ mais rebelde a essa sistematização foi (e é) o advérbio interrogativo de causa (por quê? = por qual razão? por qual motivo?), rebeldia essa assentada na larga tradição do idioma e estimulada pela analogia com o advérbio interrogativo francês (pourquoi?), com o italiano (perchè?) e certamente com o substantivo espanhol porqué (=causa, razão etc.). PORQUE (junto) era a prática adotada pelos que melhor escreviam e mais profundo tinham o sentimento de língua.
“Porque virá o conde quase de luto à festa?” (Rebelo da Silva; Última corrida de touros em Salvaterra; in Antologia Nacional, Fausto Barreto e Carlos de Laet, 6ª edição).
“Porque não fez ele isso há mais tempo?” (Machado de Assis, Papéis avulsos, 106)
“_ Que a deixe? Que a deixe porquê?” (Machado de Assis, Várias histórias)
É fora de dúvida, entretanto, que em algumas incidências o advérbio PORQUE (grafado junto) impunha à frase sensível ambigüidade, com prejuízo da clareza e conseqüente empobrecimento do estilo.
Por exemplo:
“Não sei porque você não me disse a verdade.”
Há dois entendimentos:
(1) Não sei por qual razão você não me disse a