Poema Fernando Pessoa
Deixei de ser aquele que esperava,
Isto é, deixei de ser quem nunca fui...
Entre onda e onda a onda não se cava,
E tudo, em ser conjunto, dura e flui.
A seta treme, pois que, na ampla aljava,
O presente ao futuro cria e inclui.
Se os mares erguem sua fúria brava
É que a futura paz seu rastro obstrui.
Tudo depende do que não existe.
Por isso meu ser mudo se converte
Na própria semelhança, austero e triste.
Nada me explica. Nada me pertence.
E sobre tudo a lua alheia verte
A luz que tudo dissipa e nada vence.
O poema é constituído por duas quadras e dois tercetos. Apresenta o esquema rimático abab seguindo da rima cruzada. Quanto á sua escanção possui dez silabas métricas.
O poema retrata a problemática da fragmentação do ''eu'' que admite logo no primeiro verso que '' Deixei de ser aquele que esperava'' o que reflecte um certo desanimo e despersonalização do ''eu''. Temos aqui um sujeito poético que não se consegue encontrar e que assume que '' Deixou de ser quem nunca foi''
A primeira estrofe é assim um resumo dessa incapacidade do eu lírico de se encontrar numa ambivalencia entre o passado e o futuro em que parece não haver esperança.
A segunda estrofe volta a reforçar o seu pessimismo perante a vida pois '' o presente ao futuro cria e imbui'', ou seja é o momento presente que projecta o futuro sendo que nele também não se vislumbra felicidade ou esperança.
No primeiro terceto inicia-se uma antititese remetendo-nos para essa nulidade e inexistência da felicidade.
Finalmente a ultima estrofe inicia-se com a repetição da palavra ''nada'' numa estrutura paralela entre ''nada me explica'', ''nada me pertence'' que remete mais uma vez para a nulidade perante a