Paulo Freire
Paulo Freire
Toda bibliografia deve refletir uma intenção fundamental de quem a elabora: a de atender ou de despertar o desejo de aprofundar conhecimentos naqueles ou naquelas a quem é proposta.
Se falta, nos que a recebem, o ânimo de usá-la, ou se a bibliografia, em si mesma, não é capaz de desafiá-los, se frustra, então, a intenção fundamental referida. A bibliografia se torna um papel inútil, entre outros, perdido nas gavetas das escrivaninhas.
Esta intenção fundamental de quem faz a bibliografia lhe exige um triplo respeito: a quem ela se dirige, aos autores citados e a si mesmos. Uma relação bibliográfica não pode ser uma simples cópia de títulos, feita ao acaso, ou por ouvir dizer. Quem a sugere deve saber o que está sugerindo e por que o faz. Quem a recebe, por sua vez, deve ter nela, não uma prescrição dogmática de leituras, mas um desafio. Desafio que se fará mais concreto na medida em que comece a estudar os livros citados e não a lê-los por alto, como se os folheasse apenas. Estudar é, realmente, um trabalho difícil. Exige de quem o faz uma postura crítica, sistemática. Exige uma disciplina intelectual que não se ganha a não ser praticando-a.
Isto é, precisamente, o que a "educação bancária”
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não estimula. Pelo contrário, sua
tônica reside fundamentalmente em matar nos educandos a curiosidade, o espírito investigador, a criatividade. Sua "disciplina" é a disciplina para a ingenuidade em face do texto, não para a indispensável criticidade.
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Publicado em Ação Cultural para a Liberdade, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 5 Ed., 1981. Escrito em 1968,
no Chile, este texto serviu de introdução â relação bibliográfica que foi proposta aos participantes de um seminário nacional sobre educação e reforma agrária.
2 Sobre "educação bancária", ver Paulo Freire, Pedagogia do Oprimido. Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1977,4ª ed. (Nota do Editor).
Este procedimento ingênuo ao qual