Nota Social Drummond
Carlos Drummond de Andrade Os quatros versos iniciais inscrevem o poeta no universo urbano: ele é obrigado a agir na cidade como qualquer outro cidadão, como qualquer homem da terra
. Os versos econômicos e o discurso em terceira pessoa (
O poeta é alguém de fora da poesia) dão a medida do distanciamento crítico.
O poeta transformase em personagem, sufocando a hipótese de identificálo com o próprio autor. Da mesma forma, a linguagem entrecortada corta também qualquer resquício de emoção. A cidade está em festa, contrastando com o poeta melancólico. Esse relato é feito por meio de frases fragmentadas. São flashes de uma cidade que tem pressa.
Concomitante às referências à cultura tecnológica urbana (
Máquinas fotográficas
,
automóveis ), aparecem raras menções à natureza ( árvore , cigarra ). A natureza é refém dos adventos tecnológicos ( árvore... prisioneira / de anúncios coloridos
), e ninguém se importa com isso. Da mesma forma, ninguém mais ouve o canto da cigarra, que, no texto, representa o próprio poeta. Há, portanto, uma identificação entre o poeta e a natureza: a árvore banal é prisioneira / de anúncios coloridos ; o poeta, como qualquer homem da terra
, fechase no quarto , isolase, pois ninguém mais o ouve. Melancolicamente, de forma cética, talvez se pergunte, como em
Ode ao cinquentenário do poeta brasileiro
: mas haverá lugar para a poesia?
O poeta/personagem de
Nota social expressa nostalgia do tempo em que o escritor era endeusado, era dotado de aura. Expressa também a impossibilidade de se escrever poesia na era tecnológica.3 Esse sentimento do poeta/personagem certamente não corresponde ao do poeta/autor. Drummond sempre fez questão de se distanciar dos holofotes, de rejeitar prêmios e de se colocar como um homem comum
, como declarou na última entrevista que concedeu: Minha vida? Acho que foi pouco interessante. O que é que eu fui? Fui