Neoliberalismo e individualismo
Leda Maria Paulani
Dentre os vocábulos que ganharam o debate intelectual e a mídia, nesta última década do milênio, ao lado de “globalização”, “pós-modernismo” e outros mais, encontra-se, certamente, “neoliberalismo”. Carregado de conotações políticas e ideológicas e muitas vezes utilizado pura e simplesmente como sinônimo de “liberalismo”, o termo acabou por se autonomizar, por ganhar vida própria, de modo que, no mais das vezes, é utilizado sem que se saiba exatamente a que se refere, ou, no jargão da lingüística, sem que se conheça a relação que de fato existe entre este signo e seu referente. O objetivo deste artigo é mostrar que uma definição precisa do termo passa pelo correto entendimento da natureza do individualismo que lhe serve de base. O artigo tem quatro seções. Na primeira busca-se recuperar, em largos traços, a doutrina do liberalismo clássico, particularmente seus desdobramentos no nível econômico. A segunda discute, partindo de Anderson (1995), as origens do neoliberalismo, sua relação com o ideário vigente no pós-guerra e sua vinculação com um determinado tipo de individualismo. A terceira mostra o caráter controverso da aplicação do adjetivo
“neoliberal”, tomando por base Peters (1998), para quem as políticas normalmente identificadas com o neoliberalismo não podem ser assim rotuladas e devem ser consideradas apenas como uma “estratégia de liberalização”.
I
Para falar sobre o neoliberalismo é preciso dar um passo atrás e lembrar inicialmente do liberalismo original, da doutrina que primeiramente foi reconhecida como liberalismo. Só assim entenderemos o porquê do prefixo “neo” que foi adicionado ao termo. Veremos então quais são as duas grandes diferenças que marcam esses dois momentos do pensamento social.
O liberalismo, como todos sabem, é uma doutrina social que nasce com
Locke, no século XVII, atravessa todo o século XVIII, passa pela filosofia radical inglesa, pelo iluminismo