Na capoeira o corpo pensa
O mês de novembro é bastante significativo para pensarmos os rumos das relações de poder dentro da nossa sociedade por dois motivos: o primeiro, por conta do dia da Consciência Negra. O segundo, por se comemorar hoje o nascimento de Manoel dos Reis Machado, o famoso mestre Bimba, o grande propulsor da copeira no Brasil, manifestação cultural que pode ser considerada a expressão da ironia do negro no Brasil. Há mais de quinze anos me dedico a esse ritual de jogar capoeira e reconheço – como capoeirista e não como educador físico que sou – que um dos grandes falseamentos do homem moderno é o desprezo pelo corpo com a consequente hipervalorização do pensamento e da consciência. Desprezo pelo corpo? O que isso significa? Já que basta olharmos para os templos da atualidade (as academias) para nos depararmos com legiões de corpos hiperestimulados e em forma, um verdadeiro culto ao corpo. A questão a ser discutida aqui, caro leitor, é justamente essa “forma”. Na verdade não valorizamos o corpo em si, e sim uma ideia de forma corporal. Um padrão idealizado imposto por uma cultura que despreza o risco, a vulnerabilidade, o que envelhece, e tudo aquilo que nos remete a nossa humanidade. Como educador físico eu faria um esforço para convencê-los de que o esporte ocidental (aqui incluo as atividades em academias) se caracteriza por um conjunto de técnicas que levarão o praticante a desenvolver capacidades físicas e um corpo quase invencível, forte, flexível, belo, com uma boa postura e um ótimo tônus muscular. O problema nessa concepção, na visão de Muniz Sodré, é que ela “mantém a separação entre corpo e espírito, ambos em uma mútua relação agressiva. Institucionalizado, o esporte termina imbuído do mesmo espírito competitivo vigente nas relações de produção dominantes”. Já como capoeirista afirmo: antes de ser um esporte, a capoeira sempre foi jogo, ou seja, linguagem não conceitual de gestos, imagens,