mudança da lingua
Maria Helena Mira Mateus
ILTEC / FLUL
Flor do Lácio, Sambódromo
Lusamérica. Latim em pó
O que quer,
O que pode
Esta língua?
Caetano Veloso, Língua. In Velô
1. Introdução
Perguntar o que quer e o que pode esta língua é como perguntar o que querem e podem aqueles que a falam. A língua, como todos nós, quer palpitar, crescer, tornar-se flexível e colorida, expandir-se, enfim, viver. E isso só acontece porque usamos a língua para comunicar com os outros e connosco mesmos. O mais admirável é que, com poucas dezenas de sons, todas as pessoas podem construir, em qualquer língua do mundo, uma infinidade de expressões que revelam aos outros o que pensam, o que imaginam e o que sentem. Neste aspecto as línguas têm todas o mesmo estatuto e a mesma grandeza. Como diz Pinker:
“As invenções culturais variam imenso na sua sofisticação de sociedade para sociedade
(…) Alguns grupos contam pelos nós dos ossos, e cozinham em fogos acendidos com paus afiados, enquanto outros usam computadores e fornos de microondas. A linguagem, no entanto, destrói esta correlação. Há sociedades que estão na idade da pedra, mas não existe uma língua que esteja na idade da pedra” (Pinker, 1995: 27).
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A linguagem, concretizada nas línguas, é a “maravilhosa invenção” de que nos falam Galileu, Descartes, Chomsky. E a língua portuguesa é uma das suas concretizações. Ela reflecte, também, a excepcionalidade dessa maravilhosa invenção.
2. Alguns marcos históricos
Sabemos que o português provém do latim vulgar falado no noroeste da
Península Ibérica, que foi modulado pela influência de certas características dos primitivos habitantes da região. Essa influência motivou a supressão do –l– e do –n– latinos entre vogais, produzindo assim uma das grandes diferenças entre o português e o espanhol, língua em que essas consoantes se mantiveram (p.ex. port. só, mau, cor, mão; esp. solo; malo; color; mano). Outro aspecto