Miseria
O “PESSIMISMO SENTIMENTAL”
E A EXPERIÊNCIA ETNOGRÁFICA:
POR QUE A CULTURA NÃO É UM “OBJETO”
EM VIA DE EXTINÇÃO (PARTE II)
Marshall Sahlins
Epeli Hau’ofa: a sociedade transcultural
Nascido na Nova Guiné, filho de pais tonganeses; educado na PapuaNova Guiné, Tonga, Fiji, Canadá e Austrália; ex-secretário particular adjunto [Deputy Private Secretary] do rei de Tonga, e atualmente professor-titular e diretor da School of Social and Economic Development da
Universidade do Pacífico Sul em Suva, Fiji; doutor em antropologia pela
Universidade Nacional da Austrália, com uma tese baseada em seu trabalho de campo junto aos Mekeo de Papua; autor de notáveis obras de ficção, assim como de monografias especializadas sobre a sociedade mekeo e sobre o desenvolvimento econômico em Tonga, Epeli Hau’ofa encarna, em sua própria biografia, a visão daquele espaço de vida oceânico criado pelo livre movimento dos povos insulares, que ele mesmo articulou em 1993, em desafio às concepções neocolonialistas que viam as sociedades do Pacífico como condenadas ao subdesenvolvimento devido ao seu isolamento e às suas múltiplas carências: carência de terra, de população, de recursos e, mais que tudo, de capacidade de empreendimento.
Como professor de uma universidade que atende a doze países insulares do Pacífico, Hau’ofa declarou não poder mais continuar vendendo a seus estudantes esse discurso depreciativo europeu. A ocasião de tal pronunciamento foi uma conferência pública, “Nosso mar de ilhas”, proferida durante as celebrações do 25o aniversário da Universidade do Pacífico
Sul1. A conferência gerou ondas de choque que se propagaram através do campus, e seu resultado imediato foi um pequeno volume — A New
Oceania: Rediscovering Our Sea of Islands (Waddell, Naidu e Hau’ofa
1993) — contendo a conferência de Hau’ofa e as reações de dezenove colegas. Alguns destes se declararam surpresos com o “idealismo romântico” de Hau’ofa. Com efeito, ele