Manuel Bandeira, A Evocação do Recife
Recife
Não a Veneza americana Não a Mauritsstad dos armadores das Índias Ocidentais Não o Recife dos Mascates Nem mesmo o Recife que aprendi a amar depois
-‐ Recife das revoluções libertárias Mas o Recife sem história nem literatura Recife sem mais nada Recife da minha infância A rua da União onde eu brincava de chicote-‐queimado
e partia as vidraças da casa de dona Aninha Viegas Totônio Rodrigues era muito velho e botava o pincenê
na ponta do nariz Depois do jantar as famílias tomavam a calçada com cadeiras mexericos namoros risadas A gente brincava no meio da rua Os meninos gritavam: Coelho sai! Não sai!
A distância as vozes macias das meninas politonavam: Roseira dá-‐me uma rosa Craveiro dá-‐me um botão
(Dessas rosas muita rosa Terá morrido em botão...) De repente nos longos da noite um sino Uma pessoa grande dizia: Fogo em Santo Antônio! Outra contrariava: São José! Totônio Rodrigues achava sempre que era são José. Os homens punham o chapéu saíam fumando E eu tinha raiva de ser menino porque não podia ir ver o fogo.
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