Lima Barreto
Marcos Hidemi de Lima
Em seu artigo “Literatura e consciência” (1988) Octávio Ianni aponta Machado de Assis, Cruz e Souza e Lima Barreto como “fundadores da literatura negra”, ou seja, autores que se inscrevem na chamada literatura afro-brasileira, terminologia atualmente utilizada, a fim de evitar ambiguidades e imprecisões. Ianni não titubeia em afirmar que os três escritores de ascendência negra efetivamente pertencem ao cânone da literatura brasileira, bem como ressalta que possuem qualidades singulares, possibilitando ao leitor reconhecer em suas obras um envolvimento com a causa do negro, menos explícita nos dois primeiros e de maneira bastante pungente no último.
Entretanto, para que seja reconhecidamente literatura afro-brasileira, não basta que exista um sujeito de enunciação afirmando-se negro – conforme Zilá
Bernd (1988) preconiza e ao que Luiza Lobo (2007) criticamente se opõe – fato que tiraria os méritos que Ianni observa em Machado e Cruz e Souza, porque na produção literária de ambos são poucas as figurações de um sujeito afro, e mesmo as alusões dos dois à problemática negra não são tão explícitas, naquele sentido de um discurso de preocupação racial, sociológica ou ideológica no corpo de seus escritos. O caso de Machado é emblemático, porque a negritude e a escravidão ocorrem no seu texto por meio da sutileza, da ironia e da sátira, armas das quais lança mão o escritor para promover uma crítica contundente à classe senhorial, com o intuito de mostrar a anulação do negro pelo discurso escravagista do branco, o que não inviabiliza que o negro figurando como o ‘outro’ componha o retrato da bancarrota dos donos do poder. O negro também está praticamente ausente da obra poética do simbolista Cruz e Souza, todavia não deixa de estar tão dolorosamente presente em “O emparedado”, um texto que oscila entre a prosa e a poesia, no qual este escritor deixa o protesto