Levi Strauss
Antropologia estrutural
Tradução Beatriz Perrone-Moisés
x. A eficácia simbólica1
O primeiro grande texto mágico-religioso conhecido pertencente a culturas sul-americanas, que acaba de ser publicado por Wassen e Holmer, lança luzes totalmente novas sobre certos aspectos da cura xamânica e coloca problemas de interpretação teórica que o excelente comentário dos editores certamente não esgota. Gostaríamos de reexaminá-lo aqui, não da perspectiva lingüística ou americanista que foi sobretudo adotada na discussão desse texto até agora (Holmer & Wassen 1947), mas para tentar extrair dele implicações gerais.
Trata-se de um longo encantamento, cuja versão indígena ocupa dezoito páginas divididas em quinhentos e trinta e cinco versos, coletado junto a um velho informante de sua tribo pelo índio cuna Guillermo
Haya. Como se sabe, os Cuna vivem no território da república do
Panamá, e o saudoso Erland Nordenskiöld lhes dedicou especial atenção, chegando até a formar colaboradores entre os indígenas. No caso que nos interessa aqui, foi depois da morte de Nordenskiöld que Haya enviou a seu sucessor, o dr. Wassen, um texto redigido na língua original e acompanhado de uma tradução em espanhol, que Holmer se encarregaria de revisar cuidadosamente.
O objetivo do canto é ajudar num parto difícil. Sua utilização é relativamente excepcional, já que as mulheres indígenas da América
Central e da América do Sul parem com mais facilidade do que as das sociedades ocidentais. A intervenção do xamã é, portanto, rara, e ocorre em caso de fracasso, a pedido da parteira. O canto começa por
. Este artigo, dedicado a Ferdinand de Saussure, foi publicado em Lévi-Strauss 1949d.
A eficácia simbólica
uma descrição da aflição desta última, sua visita ao xamã, a saída deste em direção à casa da parturiente, sua chegada e seus preparativos, que consistem em fumigações de feijões e cacau queimados, invocações e confecção das imagens sagradas, os nuchu. Essas imagens,