João gilberto para o século xxi
Fatídico é que não consigo ficar mais do que 10 minutos assistindo a esse programa The Voice. E não conseguiria ficar 5 minutos assistindo a qualquer outro programa atual de novos talentos. Não pela inexistência de bons cantores, longe disso, mas pela mesmice que encontro em todos. São todos - ou quase todos - apenas bons cantores. E é aí que reside o problema, ao meu ver.
Gritos, esperneamentos, pulos, gritos novamente... e a canção? "A canção que se exploda", parece que eles querem me dizer e me fazer engolir. Cantores de auditório contemporâneos são pífios e negam aquilo a que se propõem: a defender a canção com a alma. Esquecem da canção, mas não esquecem do canto. Tudo é uma proposta barata de vocalizar a música como se ela dependesse, em suma, das vocalizes. Agora eu entendo porque alguns amigos preferem a música instrumental.
Aí começa a dar saudade de um tempo no qual você não viveu, mas que o contexto parece aplicar-se, sim, atualmente. Dá saudade de João Gilberto. O João da bossa, o João da invenção, da agressiva tranquilidade e agressividade tranquila.
Conheci João já no século XXI, sem a fúria dos nacionalistas que diziam que esse troço de jazz era coisa de americanizado. E não cheguei a tempo de ouvir contextualizadamente o modo genial de Tom tocar (Tom toca meio engraçado, meio rústico e ao mesmo tempo tinindo na canção) e a poesia incomparável de Vinicius. Aliás, se há uma junção desses dois, essa junção acontece em João Gilberto: ele consegue encurtar a megalomania orquestral de Tom e fazer soar claramente a poesia de Vinicius, vide "Chega de Saudade" (faça um efeito de comparação com a versão de Elizeth Cardoso, de 1958, e a versão de João Gilberto, de 1958/59).
Certa feita li que João conseguiu traduzir a modernidade. Gostei do que ouvi, até porque eu pensava que conhecia no pop americano todo tipo de modernidade. E julgava que os excessivos arranjos eram moderníssimos. Mas conheci João e vi que