indio
Como da pira extinta a labareda,
Ainda o rescaldo crepitante fica,
Assim do ardente moço a mente acesa
Na desusada luta que a excitara,
Ainda, alerta e escaldada se revolve!
De um lado e de outro balanceia o corpo,
Como após da tormenta o mar banzeiro;
Alma e corpo repouso achar não podem.
Debalde os olhos cerra; a igreja, as casas,
A vila, tudo ante ele se apresenta.
Das preces a harmonia inda murmura
Como um eco longínquo em seus ouvidos.
Os discursos do tio mutilados,
Malgrado seu, assaltam-lhe a memória.
No espontâneo pensar lançada a mente,
Redobrando de força, qual redobra
A rapidez do corpo gravitante,
Vai discorrendo, e achando em seu arcanos
Novas respostas às razões ouvidas.
Mas a noilte declina, e branda aragem
Começa a refrescar. Do céu os lumes
Perdem a nitidez desfalecendo.
Assim já frouxo o Pensamento do índio,
Entre a vigília e o sono vagueando,
Pouco a pouco se olvida, e dorme, sonha,
Como imóvel na casa entorpecida,
Clausurada a crisálida recobra
Outra vida em silêncio, e desenvolve
Essas ligeiras asas com que um dia
Esvoaçará nos ares perfumados,
Onde enquanto reptil não se elevara;
Assim a alma, no sono concentrada,
Nesse mistério que chamamos sonho,
Preludiando a vista do futuro,
A póstuma visão preliba às vezes!
Faculdade divina, inexplicável
A quem só da matéria as leis conhece.
Ele sonha... Alto moço se lhe antolha
De belo e santo aspecto, parecido
Com uma imagem que vira atada a um tronco,
E de setas o corpo traspassado,
Num altar desse templo, onde estivera,
E que tanto na mente lhe ficara,
— "Vem!" lhe diz ele e ambos vão pelos ares.