Estudante
Claude Lévi-Strauss
Desde os trabalhos de Cannon, percebe-se mais claramente sobre quais mecanismos psico-fisiológicos estão fundados os casos atestados em inúmeras regiões do mundo; de morte por conjuro ou enfeitiçamento(1) : um indivíduo, consciente de ser objeto de um malefício, é intimamente persuadido, pelas mais solenes tradições de seu grupo, de que está condenado; parentes e amigos partilham desta certeza. Desde então, a comunidade se retrai: afasta-se do maldito, conduz-se a seu respeito como se fosse, não apenas já morto, mas fonte de perigo para o seu círculo; em cada ocasião e por todas as suas condutas, o corpo social sugere a morte à infeliz vítima, que não pretende mais escapar àquilo que ela considera como seu destino inelutável. Logo, aliás, celebram-se por ela os ritos sagrados que a conduzirão ao reino das sombras.
Incontinenti, brutalmente privado de todos os seus. elos familiares e sociais, excluído de todas as funções e atividades pelas quais o indivíduo tomava consciência de si mesmo, depois encontrando essas forças tão imperiosas novamente conjuradas, mas somente para bani-lo do mundo dos vivos, o enfeitiçado cede à ação combinada do intenso terror que experimenta, da retirada súbita e total dos múltiplos sistemas de referência fornecidos pela conivência do grupo, enfim, à sua inversão decisiva que, de vivo, sujeito de direitos e de obrigações, o proclama morto, objeto de temores, de ritos e proibições. A integridade física não resiste à dissolução da personalidade social(2). ∗
Publicado sob o titulo: “Le Sorcier et sa magie”, in Les Temps Modernes, 4o ano, n o 41, 1949, pp. 3-24.[Em português no Antropologia Estrutural. Rio de Janeiro. Tempo Brasileiro. 1975, pp. 193-213]
1
W. B. CANNON, “Voodoo’ Death”, American Anthropologist, n. s., vol. 44, 1942.
Um indígena australiano, vítima de um enfeitiçamento deste gênero, no mês de abril de 1956, foi transportado, moribundo, ao