estado paulista
88. Nós, brasileiros, marcamos certos espaços como referênciasespeciais da nossa sociedade. A casa, onde moramos, comemos edormimos — vivemos, enfim... A rua, onde trabalhamos e ganhamos aluta pela vida. A cada um desses espaços, onde convivemos comparentes, amigos e colegas de trabalho, devemos somar um outro,não menos referencial e crítico. Quero referir-me ao espaço dooutro mundo, essa área demarcada por igrejas, capelas, ermidas,terreiros, centros espíritas, sinagogas, templos, cemitérios e tudoaquilo que faz parte e sinaliza as fronteiras entre o mundo em quevivemos e esse “outro mundo” onde, um dia, também iremoshabitar. Esse mundo habitado por mortos, fantasmas, almas, santos,anjos, orixás, deuses, Deus, a Virgem Maria e Jesus Cristo, para ondetodos vão e de onde ninguém retorna... ou pelo menos retorna comfacilidade. Se na casa e na rua utilizamos o idioma do dinheiro e alinguagem das cifras, dos números, dos salários, dos cálculos e dascoisas práticas deste mundo, no universo da religião estamos muitomais interessados em conversar com Deus, com os santos, com aVirgem Maria e Jesus Cristo, e com toda a legião de entidades que alihabitam. Nosso modo de relacionamento aqui é diferente. Em vez dediscursar, rezamos; em vez de ordenar, pedimos; em vez desimplesmente falar, como fazemos habitualmente, conjugamos aforma da mensagem com seu conteúdo, suplicamos. O modo decomunicação com o além e seus habitantes, assim, é formalizado esuplicante. Feito de preces, rezas e discursos onde se acentuam acândida sinceridade, a honesta súplica, a nobre humildade e,naturalmente, a formidável promessa de renunciar ao mundo, comsuas pompas e honras. Existem formas de falar com o mundo de Deus que são solitáriase outras que são coletivas. Coletivamente, o modo mais comum éatravés da cantoria, onde a prece faz com que se juntem todos os
89. pedidos num só, que deve “subir” aos céus levado pelas harmoniasdas vozes que o entoam. De fato, no nosso modo