Especialista
Brasília, um dia qualquer desta primeira década do século XXI – Pereceu hoje, na capital da República, Dona Política Democrática do Bem Comum, após lenta agonia. Causa mortis: falência múltipla de órgãos, após septicemia generalizada. Nesta etapa terminal, seu Executivo só executava a sangue frio, o Legislativo legislava apenas em causa própria, e o Judiciário tardava e falhava. A infecção no regime representativo era crônica. Dona Política, alguns anos antes de morrer, já exalava, em seu bem equipado quarto de moribunda, um cheiro insuportável. As despesas com a longa internação e o sepultamento foram pagos por grandes conglomerados privados, a maioria do setor financeiro. Ao velório de Dona Política compareceram altas autoridades do país. O Presidente da República deu animada entrevista para correspondentes estrangeiros, dizendo conhecer a indigitada desde os tempos da Grécia Antiga, quando era considerada amiga fiel de todos – à exceção dos escravos, das mulheres e dos estrangeiros. Senadores de sábias cabeças brancas, contristados, confabulavam no velório. O momento de nojo (como eles continuam a denominar o luto) fez com que notórios adversários de ocasião, que tinham protagonizado recente duelo para provar quem era mais canalha, ficassem lado a lado e até trocassem algumas idéias. Alguns representantes da esquerda também compareceram. As lágrimas sinceras pelo passamento de Dona Política Democrática não duraram muito: logo foram secando e a perplexidade deu lugar a um inusitado conformismo, na linha do “a vida é assim mesmo” e “Deus sabe o que faz”. “O jeito é seguir em frente e nos acostumarmos com sua ausência”, disse um deputado que fora líder estudantil há 30 anos, com seu corpo 30 quilos mais pesado. Coroas de flores abarrotavam a capela. As mais vistosas eram as assinadas pelo FMI e pelo Banco Mundial. O Presidente dos EUA enviou mensagem, afirmando saber o que os brasileiros estavam sentindo, pois seu