Dois conceitos de Liberdade - Isaiah Berlin
A teoria política é um ramo da filosofia moral, que parte da descoberta ou da aplicação de noções morais na esfera das relações políticas. As palavras, as noções e os atos políticos não são inteligíveis exceto no contexto das questões que dividem os homens que a elas recorrem.
Por consequência, é provável que as nossas próprias atitudes e atividades permaneçam obscuras para nós, a menos que compreendamos os problemas dominantes do nosso próprio mundo. O maior deles é a guerra aberta travada entre dois sistemas de ideias que devolvem respostas divergentes e antagónicas ao que é desde há muito a questão fulcral da política – a questão da obediência e da coerção.
“Por que razão devo (ou alguém) obedecer a outrem?”, “Por que razão não hei-de viver como me apraz?”, “Tenho de obedecer?”, “Se desobedecer, posso ser coagido?”, “Por quem, em que medida, em nome de quê e por causa e quê?”.
Quanto às respostas à questão dos limites permissivos da coerção, defendem-se perspetivas antagónicas, no mundo de hoje, congregando cada uma a fidelidade de grandes números de indivíduos. Coagir um indivíduo é privá-lo da liberdade – da liberdade de quê? Quase todos os moralistas da história da humanidade têm exaltado a liberdade. Como a felicidade e a bondade, como a natureza e a realidade, é um termo cujo significado é tão poroso que são poucas as interpretações a que consegue resistir. Não pretendo discutir nem a história desta palavra multifacetada nem as mais de duzentas aceções registadas pelos historiadores das ideias.
Proponho-me analisar tão só duas dessas aceções – que são fulcrais, com uma longa história por detrás delas e, atrevo-me a dizer, uma história futura.
O primeiro desses sentidos políticos de liberdade ou autonomia, que designarei por sentido
“negativo”, está implícito na resposta à questão “Qual a área dentro da qual ao sujeito – um indivíduo ou um grupo de