DIREITO
AS DIMENSÕES DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: CONSTRUINDO UMA COMPREENSÃO JURÍDICO-CONSTITUCIONAL NECESSÁRIA E POSSÍVEL
INGO WOLFGANG SARLET*
Introdução
Se de fato há como acolher a lição de Antonio Junqueira de Azevedo1, no sentido de que o acordo a respeito das palavras “dignidade da pessoa humana” infelizmente não afasta a grande controvérsia em torno do seu conteúdo, e se é igualmente correto partir do pressuposto de que a dignidade, acima de tudo, diz com a condição humana do ser humano, e, portanto, guarda íntima relação com as complexas, e, de modo geral, imprevisíveis e praticamente incalculáveis manifestações da personalidade humana, já se percebe o quão difícil se torna a busca de uma definição do conteúdo desta dignidade da pessoa e, portanto, de uma correspondente compreensão (ou definição) jurídica. Assim, por mais que não seja esta a posição a ser adotada, verifica-se que não é inteiramente destituída de qualquer fundamento racional e razoável a posição dos que refutam a possibilidade de uma definição, ou, pelo menos, de uma definição jurídica da dignidade2.
De outra parte, tendo em mente que o objetivo do presente estudo é o de pautar e discutir alguns aspectos ligados à compreensão do conteúdo e significado, ou melhor, dos conteúdos e significados, e, portanto, daquilo que se poderia designar de dimensões da dignidade da pessoa humana, com o enfoque voltado para a ordem jurídica, notadamente pelo prisma da ordem jurídico-constitucional, é certo que um olhar — ainda que limitado — sobre algumas das contribuições oriundas do pensamento filosófico também aqui se revela indispensável. Com efeito, se por vezes a Filosofia posiciona-se, de modo equivocado, como blindada ao Direito (embora seja o Direito, e não a Filosofia, quem acaba por definir — e decidir — qual a dignidade que será objeto de tutela do Estado e, além disso, qual a proteção que este pode assegurar