DICIONÁRIOS E ENSINO DE LÍNGUAS
Dicionários e ensino de línguas
Philippe Humblé (Universidade Federal de Santa Catarina)
1. Introdução
A lexicografia, uma área quase subalterna da lingüística aplicada, vive tradicionalmente uma situação contraditória: todos admitem usar dicionários, mas ninguém os estuda. Na sala de aula, o professor de línguas estrangeiras é costumeiramente intimado a responder à pergunta “qual o dicionário que você aconselha?” Ele permanece necessariamente mudo, ou finge que não, mas nem por isso é levado a fazer uma pesquisa mínima que dê uma resposta fundamentada à pergunta. Os dicionários são usados, mas pouco questionados. Os menos usados, os monolíngües, são os menos questionados. Os bilíngües, os mais.
Várias razões podem ser aduzidas para explicar este fato. A primeira decorre do fato de que qualquer dicionário, mesmo de dimensões reduzidas, é um empreendimento a longo termo. E como já dizia La Rochefoucauld: “As pessoas têm grandes ambições e pequenos projetos”. O oficio do lexicógrafo é visto como enfadonho, meticuloso em demasia e, não poucas vezes, interminável. Daí a percepção do dicionário como entidade fora deste mundo, incriticável, sem autor, ou com um autor mítico. A Introdução ao Aurélio menciona vários casos de lexicógrafos que nunca viram a luz do outro lado do alfabeto, que morreram no meio da letra M ou enlouqueceram no limiar da letra O. Daí a percepção da lexicografia como o mundo de um respeitoso tédio. O próprio Doctor Johnson, autor do primeiro dicionário moderno de inglês, se autocaracterizava pouco romanticamente como: “a writer of dictionaries; a harmless drudge, that busies himself in tracing the original, and detailing the signification of words”1. A perspectiva de se confrontar com os frutos de um trabalho tão enfadonho não parece, para um estudioso em potencial, um assunto muito atraente. Talvez seja a falta de estudiosos, combinado com a sua contraditória