dançando com o diabo
Filme traz até depoimento de chefe do tráfico que controla 15 favelas na cidade
"Dançando com o Diabo" expõe a complexidade e contradições do universo de violência, do tráfico e da polícia, e a ação religiosa
RAPHAEL GOMIDE
DA SUCURSAL DO RIO
O homem chega carregado à Assembleia de Deus Ministério da Restauração, em Senador Camará, zona oeste do Rio.
Olho inchado, as feições deformadas, perna com fratura exposta, está inconsciente de tanto apanhar de traficantes. "Era para ter tomado logo um [tiro de pistola] .40 na cara, vendeu pó royal em vez de pó [cocaína]. Demos um pau mesmo, era para ter morrido, tapear os outros é motivo de cerol, cortar todinho e sumir", diz para a câmera, de cara limpa, Juarez Mendes da Silva, o Aranha, 28, chefe do tráfico de um complexo com 15 favelas na zona oeste do Rio e 150 "funcionários" armados, ao custo mensal de R$ 94 mil. Foi ele quem determinou a surra.
Aranha tem tatuagens nos antebraços: em uma lê-se Jesus, na outra Cristo. Jura que pretende abandonar o tráfico para ficar com Jesus. Como controla tudo? "É Deus!" O documentário "Dançando com o Diabo" expõe a complexidade e contradições do universo de violência, do tráfico e da polícia, e a eventual libertação pela religião, em linhas tortas e tênues.
Foi o correspondente do jornal britânico "The Guardian" no Rio, Tom Phillips, quem conseguiu duas coisas improváveis para um inglês: a partir do pastor Dione (Johnny) Santos, ter acesso a traficantes das favelas do Rio, como jornalista, e convencê-los a mostrar o rosto a um cineasta estrangeiro, Jon Blair, sul-africano naturalizado britânico. O filme saiu por US$ 500 mil e será exibido no Festival do Rio neste mês.
Ao lado do fotógrafo e cinegrafista americano Douglas Engle -que já trabalhara no México e em El Salvador-, Phillips passou 18 meses visitando favelas da zona oeste e conquistando a confiança dos traficantes. Até que, há um ano, por 45 dias, uma equipe de seis