Cuitelinho
Pena Branca e Xavantinho
Cheguei na beira do porto
Onde as ondas se espáia
As garça dá meia volta
E senta na beira da praia
E o cuitelinho não gosta
Que o botão de rosa caia, ai, ai, ai
Aí quando eu vim de minha terra
Despedi da parentaia
Eu entrei no Mato Grosso
Dei em terras paraguaia
Lá tinha revolução
Enfrentei fortes bataia, ai, ai, ai
A tua saudade corta
Como aço de navaia
O coração fica aflito
Bate uma, a outra faia
Os óio se enche d`água
Que até a vista se atrapaia, ai, ai, ai
Cuitelinho é o nome do beija-flor no interior do mato Grosso.
Essa música retrata história de um lugar e do homem do campo do interior do Brasil, que cruza um país no sentido leste-oeste, mostrando a saudade da familia e do seu lugar de origem.
A música tem autoria do Xavantinho e Pena Branca.
“Cuitelinho” é o título de belíssima canção “folclórica”, já gravada por dezenas de cantores. Sua letra é corpus muito interessante para quem quiser estudar português, isto é, quiser saber como é o português falado no Brasil. Sendo música do folclore, tem evidentemente muitas características da gramática do português popular. As duas mais salientes são as pronúncias “espaia”, “parentaia”, “bataia”, “navaia, “faia”, “oio” e “atrapaia” (a consoante grafada “lh” é sistematicamente substituída pela semivogal “y”), e as concordâncias nominais e verbais em “as onda se espaia”, “terras paraguaia”, “os oio se enche”, “fortes bataia”). Observe o caro leitor que, nestes grupos nominais, o plural é marcado apenas na primeira palavra, seja ela um artigo (as onda, os oio etc.), seja um substantivo (terras paraguaia) ou um adjetivo (fortes bataia).
Há mais dados interessantes: ouvindo as diversas gravações, pode-se comparar as pronúncias dos “ee” de “despedi”, do “o” de botão, além da variação de “beira / bera”, “volta / vorta”, do “r” de “garça” e de “corta” etc.
Repito o mantra de sempre que analiso fatos que alguns simplesmente consideram erros: pode-se