Conto
"Conheço a história do menino lobo que transformo e faço a minha história desigual, voluntária e aterrorizante porque envolve uma menina calma, um menino voraz, um lobo voraz e uma paisagem morta. Não sei quando se passou a história agora narrada, não sei se foi verdade ou mentira ou se é um vôo livre que faço com a minha imaginação destemperada, mas o fato é que aconteceu de verdade em algum mundo em algum lugar em alguma floresta. Era uma vez uma menina de dentes afiados. Quem para ela olhasse talvez sentisse um frio de medo na espinha, mas mal sabiam que, apesar dos caninos desproporcionais, era de uma calma surpreendente. Não se envolvia com meninos, com amores e vivia só, no meio dessa floresta de faz-de-conta, ela e seus dentes afiados. Comia frutas e bebia tudo o que encontrasse pela frente: água de rio, de chuva, de orvalho e de choro...porque chorava quando se sentia muito só, mas só quando essa sensação era muito grande e a fazia lembrar dos tempos de muito tempo atrás, quando ainda era menina e vivia cercada de outras meninas iguais. Todas de caninos lindos e longos. Até que um dia foi viajar para conhecer mundos, meninos e lobos...e foi ficando para trás essa história de menina cercada de outras meninas porque o corpo já era de menina grande e, de alguma forma estranha, nunca mais voltara. Mas gostava mesmo é de passear, ouvir barulho de chuva batendo no chão, no topo das árvores e nas folhas verdes que, de tão grandes, mas pareciam seus grandes dentes afiados e brancos. Nessas andanças de mundo corrido não tinha encontrado nada, nem lobos – que um dia quisera tanto ver – nem meninos, até porque nunca tinha visto um e não reconheceria mesmo. Talvez sentisse pelo cheiro, pelo perfume de pele ou mesmo pela insanidade de seu ventre, mas nunca aconteceu. Então se dedicava a ver mato, sentir esses verdes roçando suas pernas, suas coxas e seu ventre de dentro da cabeça. Tudo vinha na hora certa, essa sensação estranha de ser