CENTRALIZAÇÃO

553 palavras 3 páginas
definição das infracções, a hierarquia da sua gravidade, as margens de indulgência, o que era tolerado de facto e o que era permitido de direito, modificou-se amplamente nos últimos 200 anos. Alguns crimes deixaram de o ser, nomeadamente os ligados à religião, enquanto outros perderam parte da sua gravidade. Continuaram a ser julgados os crimes e os delitos definidos juridicamente pelo código, mas passaram a julgar-se também “as paixões, as anomalias, as enfermidades, os instintos, as inadaptações, os efeitos do meio ambiente ou da hereditariedade. Punem-se as agressões mas, por meio delas, as agressividades, as violações, os assassinatos que são também impulsos e desejos” (Foucault, 1977, p. 21). É a sombra, o que está por detrás, que é na realidade julgado e punido, com recurso a circunstâncias atenuantes ou a elementos circunstanciais. É julgada uma entidade “juridicamente não codificável: o conhecimento do criminoso, a apreciação que dele se faz, a relação entre o seu passado e o crime, o que se pode esperar dele no futuro” (id., p. 2). E, graças à relação entre medicina e jurisprudência serão julgados, desde o séc. XIX, os monstros, as anomalias psíquicas, os pervertidos, os inadaptados. A ideia era de improcedência judicial pura e simples, em caso de loucura comprovada. No entanto, mesmo os loucos eram frequentemente considerados culpados, se bem que “quanto mais louco, tanto menos culpado” (id., p. 23). Nessa altura, deveria ser enclausurado e tratado, em vez de punido .

Assim, a sentença que condena ou absolve deixa de ser um simples julgamento de culpa, passando a implicar uma apreciação de normalidade ou de prescrição técnica para uma normalização possível. O juiz já não julga sozinho. “Pequenas justiças e juízos paralelos multiplicam-se em torno do julgamento principal” (id., p. 24): médicos, psiquiatras, psicólogos, educadores, peritos vários, “juízes anexos, mas juízes de todo o modo” (ibid.). Um saber, técnicas, discursos científicos, formam-se e

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