Canonico
Raquel Kritsch 1
O século XIII foi, com certeza, um período historicamente marcante não apenas no que respeita ao desenvolvimento material mas sobretudo no que se refere ao progresso intelectual experimentado no Velho Continente – e que tanto influenciaria os séculos finais da Idade Média. Os avanços teóricos ocorriam velozmente: a recuperação do direito romano e os desenvolvimentos de filosofia natural, incrementados com o movimento das grandes traduções de filósofos antigos do árabe e do grego, forneciam instrumentos novos para a análise social e para uma nova abordagem política. Também a emergência de novos atores urbanos, como a intelectualidade letrada saída das nascentes universidades, alterava a realidade social. A sociedade européia passava a ser formada não apenas por cavaleiros e camponeses, mas também por uma rica e bemeducada burguesia e por uma burocracia pequena, mas em franca expansão. Do ponto de vista do desenvolvimento das idéias políticas, o século XIII marcou, entre outras coisas, a consolidação da tendência de fortalecimento do poder papal que já se fazia sentir na Ecclesia desde a reforma gregoriana. Agora, no entanto, os ocupantes da cadeira pontifícia passariam a reivindicar, com maior ou menor coerência, a supremacia e o controle das duas espadas: da espada espiritual e do gládio temporal. O sumo sacerdote reclamaria para si a jurisdição de facto e de iure sobre a comunidade cristã. A afirmação desse pensamento denominado pelos historiadores hierocrático — que culminaria um século depois na defesa de uma espécie de “monarquia papal absoluta” por Egídio Romano — deu-se contudo de forma gradual e nem sempre clara. Na tentativa de se impor ao regnum, cuja figura máxima era o imperador, a Igreja selava alianças com reis e autoridades locais e, com isso, fortalecia
indiretamente esses poderes à época considerados menores. Mas o fato realmente importante era o de que, nessa disputa com o