Bocage
SONETOS E OUTROS POEMAS Bocage
I - SONETOS Incultas produções da mocidade Exponho a vossos olhos, ó leitores ; Vede-as com mágoa, vede-as com piedade; Que elas buscam piedade, e não louvores; Ponderai da Fortuna a variedade Nos meus suspiros, lágrimas e amores ; Notai dos males seus a imensidade, A curta duração dos seus favores ; E se entre versos mil de sentimento Encontrardes alguns, cuja aparência Indique festival contentamento, Crede, ó mortais, que foram com violência Escritos pela mão do Fingimento, Cantados pela voz da Dependência.
Chorosos versos meus desentoados, Sem arte, sem beleza, e sem brandura, Urdidos pela mão da Desventura, Pela baça Tristeza envenenados : Vede a luz, não busqueis, desesperados, No mudo esquecimento a sepultura ; Se os ditosos vos lerem sem ternura, Ler-vos-ão com ternura os desgraçados : Não vos inspire, ó versos, cobardia
Da sátira mordaz o furor louco, Da maldizente voz a tirania : Desculpa tendes, se valeis tão pouco ; Que não pode cantar com melodia Um peito, de gemer cansado e rouco . De suspirar em vão já fatigado , Dando trégua a meus males eu dormia ; Eis que junto de mim sonhei que via Da Morte o gesto lívido, e mirrado : Curva fouce no