Bertrand
Bertrand Russell
Dúvidas filosóficas
Bertrand Russell
Talvez fosse de se esperar que eu começasse pela definição de “filosofia”, mas, certo ou errado, não me proponho a tal. A definição de “filosofia” variará segundo a filosofia que adotarmos; para começar, diremos apenas que há certos problemas, julgados interessantes por certas pessoas, mas que não pertencem, pelo menos até agora, a qualquer uma das ciências especiais. Esses problemas são de molde a levantar dúvidas a respeito do que comumente se entende por conhecimento; e se as dúvidas requerem resposta, esta virá unicamente por meio de um estudo especial, a que denominamos “filosofia”. Portanto, o primeiro passo para definir “filosofia” está na indicação de tais problemas e dúvidas — e será também o primeiro passo no verdadeiro estudo da filosofia. Entre os tradicionais problemas da filosofia, há alguns que não parecem merecer, em minha opinião, tratamento intelectual, por transcenderem nossa capacidade cognitiva; desses problemas não cuidarei. Existem outros, porém, para os quais, embora não seja possível encontrar-se solução definitiva neste momento, pode-se indicar o rumo para uma busca de solução, e o tipo de solução que, em tempo oportuno, venha a se revelar possível.
A filosofia origina-se de uma tentativa obstinada de atingir o conhecimento real. Aquilo que passa por conhecimento, na vida comum, padece de três defeitos: é convencido, incerto e, em si mesmo, contraditório. O primeiro passo rumo à filosofia consiste em nos tornarmos conscientes de tais defeitos, não a fim de repousar, satisfeitos, no ceticismo indolente, mas para substituí-lo por uma aperfeiçoada espécie de conhecimento que será experimental, precisa e autoconsistente. Naturalmente, desejamos atribuir outra qualidade ao nosso conhecimento: a compreensão. Desejamos que a área de nosso conhecimento seja a mais ampla possível. Isto, no entanto, é mais da competência da ciência que da filosofia.