Ética negativa
1.1. A crítica ao afirmativo.
A reflexão ética de Julio Cabrera começa com sua crítica ao afirmativo, ao pensamento filosófico acrítico que estabelece um valor estrutural da vida humana sem uma reflexão filosófica mais abrangente. Todas as éticas afirmativas giram em torno da pergunta "como devo viver?", mas tal pergunta parece ser o estágio final da reflexão ética, pois supõem uma resposta afirmativa a questão "devo viver?".
"As questões de se devo viver e se devo ser pai, ou seja, se essas duas intencionalidades são morais ou não – no mesmo sentido no qual isso é perguntado de qualquer outra intencionalidade posterior, já dentro da vida – são as primeiras questões éticas que devem ser debatidas e para as quais é preciso achar respostas (CABRERA, 1989, p. 9)."
Um projeto de ética deve partir da problematização da questão "devo viver?" e deve estar isento de qualquer posição ideológica, religiosa ou política a respeito da vida. Pensar a possibilidade do ser é uma questão estrutural e não deve ser afetada por valores projetados no intramundo. O filósofo deve abrir mão de todas as amarras (até mesmo das mais naturais como o possível instinto de sobrevivência). Cabrera irá concluir depois de sua reflexão que manter um sistema moral dentro de nossas condições de existência é totalmente impossível, a reflexão ética tradicional (afirmativa) só tem espaço dentro de um sistema acrítico. Cabrera escreve em seu "Projeto de Ética Negativa" que:
"A tese crítica fundamental do livro é a seguinte: que se os valores morais vigentes, como veiculados pelos sistemas morais da tradição, são deslocados do plano das perguntas "Como devo viver?" e "Que tipo de pai devo ser?" para o plano das perguntas, mais primitivas, "Devo viver?" ou "Devo ser pai?", ou seja, deslocados para um plano reflexivo mais radical, o sistema desses valores se torna inevitavelmente inconsistente. Para que esse