O Anticristo
«A palavra 'Cristianismo' é um equívoco - no fundo existiu somente um único cristão e esse morreu na cruz. O 'Evangelho' morreu na cruz.» [Nietzsche, O Anticristo, § 39. °]
A pessoa de Cristo distingue-se radicalmente do Cristianismo, da tradição das Igrejas Cristãs. O que é Cristo para Nietzsche? É um ser decadente, um ser fraco, incapaz de enfrentar a realidade. A sua conduta não revela, contudo, ao contrário dos padres e sacerdotes, qualquer hipocrisia ou ressentimento. Impotente para mudar a ordem do mundo, incapaz de suportar a realidade exterior, refugia-se na interioridade. Não nega a realidade, não a condena.
Protege-se dela mediante a criação de um reino simbólico, que não é deste mundo. Não nega este mundo; simplesmente ignora-o. Afirma-se como diferente sem ter necessidade de desvalorizar ou de converter fanaticamente quem vive de modo diferente. Este decadente tem alguma nobreza de carácter. Ao construir para si mesmo um mundo imaginário (o Reino de Deus), não comete a baixeza de amaldiçoar a terra, os instintos humanos. Pode dizer-se que, ao contrário daqueles que se consideraram seus seguidores, ele viveu para além do bem e do mal. Cristo simboliza o tipo de existência que, aquém da poderosa afirmação da realidade própria do super-homem, poderia servir de modelo ao fraco, permitindo - lhe escapar ao ressentimento e à intoxicante «moralina» que os padres produziram para contaminar os tipos mais nobre e elevados.
Cristo é a forma de existência centrada no amor e na não-violência. O seu mundo interior dá um sentido à sua vida, é um remédio, uma consolação que, àquele que não suporta o carácter trágico e brutal da existência, indica um caminho diferente do da fuga à terra em direcção ao Além.
«Que significa a