G Morente
Em todo pensamento existe o pensamento como ato e o objeto como conteúdo deste ato; o pensamento que pensa e o pensado no pensamento.
Esta distinção que fizemos já numa lição anterior leva-nos à reflexão de que objeto do pensamento, o pensado no pensamento entra em contacto comigo através do pensamento.
Ê, pois, a respeito de mim, mediato. Necessito o intermédio do ato de pensar para pôr—me em contacto com ele. Pelo contrário, o pensamento do pensado é para mim imediato; não necessito de intermédio algum para estar em mim na mais imediata presença. Quando eu penso algo, o algo em que penso está, por assim dizer, mais longe de mim. Meu pensamento deste algo, em troca, é o que está mais perto de mim; tão perto de mim que sou eu próprio pensando. Por isso o chamamos imediato. A imediatez faz com que o pensamento que eu penso seja meu próprio eu no ato de pensar. Por isso a identidade entre o pensamento e o eu é o primeiro resultado a que se chega quando, no afã de obter algo indubitável, abandonamos os objetos que são duvidosos, já que são mediatos, e entramos a firmar nossa atenção sobre os pensamentos que são indubitáveis, precisamente porque são imediatos, porque são meu próprio eu pensando.
Esta identidade do pensamento que é imediato e o próprio eu é aquilo que Descartes descobre e o que constitui para ele a base, o fundamento mesmo de toda a filosofia.
Aplicando a dúvida a tudo quanto se apresenta, resume esta aplicação metodológica da dúvida nos termos de afastar de si, como duvidosos, todos os objetos, e, em troca, de não considerar como indubitáveis mais do que os pensamentos. E por que considera indubitáveis os pensamentos? Porque os pensamentos estão tão imediatamente próximos a mim, que se confundem com meu próprio eu. E é esta imediatez que os torna indubitáveis e ao mesmo tempo os faz fundir-se todos eles na unidade do eu. Existem os pensamentos, responde Descartes à pergunta metafísica. Mas como os pensamentos