ACABOU A INFÂNCIA? Ou até quando teremos de acreditar na ilusão de que a educação escolar e os modos de brincadeiras prescritas e formatadas deverão funcionar como antídoto à vigilância e punição dos adultos? Não há, na verdade, espaço para que se reconheça a diferença. Se, por um lado, o adulto toma a infância como período que contém a chave explicativa para o que ele é, por outro ele faz de tudo para que os infantes deixem de sê-lo. Isto é, se por um lado tomamos a infância como "criança esperança", construímos mais e mais teorias sobre ela, transbordamo-nos de nostalgia sobre a aurora de nossas vidas, por outro cuidamos para que as crianças peçam esmolas nas ruas, prostituam-se, tornem-se "aviõezinhos" do tráfico ou, de mesma ordem, transformem-se em miniexecutivas de agendas lotadas, excedendo-se entre a escola de tempo integral, o balé, o inglês ou qualquer outra atividade que possa ser monitorada através de um celular ou de um palmtop. Em certos casos, senão a maioria deles, a miniaturização das ações dos mais velhos é o retrato fiel da realidade, sob as piores formas de exploração. Há de se entender, portanto, por que muitas crianças de hoje hesitem em tornar-se adultos. Como muitos devem saber, o conceito de infância é recente. Ele compõe a constelação das tantas representações que a modernidade inventou e nos legou. Até a Idade Média, os registros eram pouco precisos e a idade cronológica pouco importava. Havia algumas formas rudimentares de delineamento da temporalidade da vida, entre as quais a que dizia serem cinco esses tempos, a saber: a idade do brinquedo; a idade da escola; a do amor e esporte; a da cavalaria e guerra; e, finalmente, a idade sedentária, destinada aos homens das leis e da ciência. Entretanto, como podemos inferir com Aries (1981), essa precária diferenciação - que não deixa de resvalar-se nos tempos atuais - não impedia que as crianças fossem tratadas como adultos em miniatura. Elas usavam as mesmas roupas dos adultos, jogavam os